A mulher militante e um muro muito alto
“A mulher militante fala demais, nem escuta o que o cara tem pra falar. Entre uma militante e uma mulher mais normal, o homem sempre vai escolher a mulher mais normal”.
Ouvi isso e juro que ao final da última frase eu já não era a mesma pessoa do início da conversa. É incrível como algumas poucas palavras nos destroem. Não tive resposta e em poucos segundos eu tava imersa num sentimento horrível, pensando em tudo que já fiz de errado nesse mundo de meu deus e em todas as pessoas que, de uma forma ou outra, fui relapsa.
Eu comprei o discurso e fiquei pensando que eu preciso ser “uma mulher mais normal”. Não me reconheci. Talvez eu consiga explicar o sentimento que resultou deste pequeno episódio escrevendo que foi como se todas as portas se fechassem ou como se se construísse um muro muito, muito alto e a mulher militante estivesse condenada a ficar, para sempre, do lado de fora. Excluída, errante, anormal.
Demorou um bom tempo pra eu lembrar de todas as vezes que me desencorajaram a militar… Lembrei de muita coisa, de frases e discussões.
E entendi que “a mulher militante que fala demais” não pode errar. E que as pessoas falam tudo o que pensam para “a mulher militante que fala demais” porque ela, com certeza, é forte e aguenta.
De forma direta ou velada, TODAS as militantes são diariamente postas à prova.
A última vez que eu tinha sentido essa pressão pra parar foi quando a Marielle foi assassinada. Lembro que eu e mais companheiras passamos o final daquela noite no telefone e em cada conversa, com cada amiga/o e parente, eu reforçava que é por mulheres como a Marielle não poderem viver que esse mundo precisa mudar.
Todos os dias eu escolho militar.
Não é uma escolha fácil, mas é uma escolha consciente.
E é um baita desafio!
Por isso, se você tem alguma amiga militante, se sua companheira ou mãe milita, encoraje-a. Toda a sociedade tá forçando ela constantemente a desistir e são de pequenas ações e palavras boas que nos nutrimos. E seguimos.
Ah, e sobre as escolhas dos homens, só posso escrever isso: respeitem as minas. Todas as minas.
Por Nana Sanches
Feminista Marxista, Coordenadora da Casa de Referência Mulheres Mirabal e integrante da Unidade Popular
Foto: arquivo de Nana Sanches