Depois do filme É Possível (que mostra o que a mídia esconde sobre quem são os acampados pela reforma agrária), assistido por umas 20 pessoas, numa pequena sala que se chama Quilombo das Artes, conversamos sobre a terra que o agricultor pobre não tem, num país que é um continente e os latifúndios se estendem de horizonte a horizonte. Estávamos no Assentamento Urbano Comunidade Autônoma Utopia e Luta.
“Se o campo não planta, a cidade não janta”, alertam os sem terra. Mas pros que vivem na metrópole – mundos distantes -, parece um blefe. A comida química, produzida com veneno e entregue plastificada (lucro para o empresário, doença para quem come) se derrama pelas gôndolas dos super mercados. O negócio funciona. A maioria acredita que lhes basta esse lixo pra encher o estômago.
Os que hoje à noite debatem a opressão do sistema e a resistência pelas brechas, são os que vão leiloar em praça pública o espaço público. É lúdico, didático. Ao invés do discurso, que na rua ninguém mais tem ouvidos pra ouvir, o teatro engajado que ocupa, perturba, instiga, faz pensar. Até tarde, enquanto a madrugada não os faz tropeçar de sono, estão no quilombo planejando a ação direta.
20 de maio amanhece como Dia Internacional da Biodiversidade. Nas barracas em círculo: sementes crioulas; palavras novas contra velhos conceitos; mudas de árvores em extinção; sentimentos antigos contra novas formas de oprimir, calar ou dominar; cachaças artesanais pra proteger do frio e colorir a festa da mente e a dança do corpo; notícias sobre as dores das terras e dos rios; camisetas, ervas e livros; denúncias de como maltratamos os animais. A rádio poste toca uma canção nativa, que carrega a memória do tempo, com ela pulsa agora nossas vidas. Na praça, os que passam desatentos não veem que nessas barracas, essa gente simples que não dobra a espinha, defende o mundo sadio e feliz para todos.
Quanto dinheiro é preciso pra comprar o que não tem preço? Nosso planeta e nossa essência, nossos únicos patrimônios. É ingênuo quem se entrega a utopia, e luta? Ou ingênuo é quem deixou de sonhar, quem se encolhe e se apequena? É ingênuo o que protesta e enfrenta quem oprime, ou quem se deixa oprimir, vende seus anos para as máquinas da indústria e sua liberdade para o dinheiro do patrão?
Viver é consumir? Ser feliz é consumir? Até onde agüentaremos deixar que tudo tenha preço: as florestas, os caminhos, o pôr-do-sol. Até quando agüentaremos um sistema que divide o mundo em habitantes de primeira, segunda ou terceira ordens, conforme o dinheiro que tenham? Até quando acreditaremos que as coisas têm o mesmo valor que as pessoas, e que é preciso amar tanto o plástico quanto se ama a gente?
Mais fogo eu lhes peço! Mais fogo pra acender por dentro, queimar as ilusões, derreter maquiagens, iluminar outro caminho:
Dia da Biodiversidade – Porto Alegre/RS – Ação direta from Thais on Vimeo.
Em breve aqui, o “leilão” completo.
Para saber mais sobre a cinerreportagem “É Possível” clique aqui e aqui