Em 2024, o maior desafio da chapeuzinho vermelho não é o lobo mau, mas uma plateia cheia de pré-adolescentes

Numa tarde de segunda-feira, no Teatro São Pedro, aconteceu sessão da peça Chapeuzinho Vermelho, uma adaptação de premiado texto de Joël Pommerat, realizado pelo Projeto GOMPA. Na sinopse, há a menção de que a releitura contemporânea traz à tona uma espécie de “iniciação ao medo”. E é verdade! Só que… Não só ao medo para pequenas crianças, que estavam presentes aos montes – e que adoraram, mesmo que algumas tenham sido retiradas da plateia no colo nos sustos óbvios que viriam do lobo mau. Totalmente natural, reações normais e certamente esperadas, que não prejudicam em nada a proposta do espetáculo. Agora… Para pais e mães de pré-adolescentes – como este que escreve e aquela que tirou as fotos desta resenha – a sessão foi de tremenda tensão. Meninas e meninos impassíveis, impossíveis de ficarem em silêncio ou sentadas quietos por mais de uma dezena de minutos, conversas, cochichos, deboches de todos os lados, caras de nojo e uma pífia participação afogada pela grande interatividade dos pequenos, que cantaram antes, assustaram-se durante e aplaudiram depois. Apenas no ápice da linguagem metafórica apresentada pela peça, de forma muito inteligente, a trazer os perigos dos “lobos maus” da vida real, com frases do tipo “deita aqui”, “vem para baixo do cobertor” e “eu vou te comer” – totalmente coerentes com as interpretações e contextos -, a reação uníssona da turba dos 12, 13 anos, que tomou conta sobre todas as vozes, foi de chiste, de onomatopéia gracejosa, nada grave. O que faz gerar isso? Por que para os pequenos o medo do lobo mau foi evidente, de pulos em cadeiras, gritos de espanto, mas para as meninas e meninos no limiar da puberdade foi de humor sexualizado? Há muitos aparelhos ligados procurando redes roteadas acessando informações descontroladas por pessoas jovens sem limitações – porque pode ser, inclusive, impossível. A sensualização da inocência está aí, a cada clique, em cada som, nas imagens que minha filha de 10 anos, por exemplo, já acessa em seus dispositivos com certo controle. É muito difícil – e vai ficando pior com o que vem acontecendo no compêndio ideológico-legal em disputa no Congresso e nas ágoras do poder brasileiro. E isso complica a luta contra o abuso, contra a violência sexual em crianças e adolescentes. Pode, invariavelmente, confundir a mensagem. Me apavorei. Mas também me encantei. Talvez um bom público-alvo para esta obra seja exatamente o de pessoas com um hiato etário, evitando-se pessoas dos 12 aos 18 anos, trabalhando-se as pontas para melhorar a compreensão no meio – e não por causa do texto trabalhado de forma excelente pelos autores, mas pela conjuntura da nossa atualidade. E pais e mães – sozinhos – também precisam acessar essas metáforas, também precisam se identificar nos papeis da mãe, da vovó e, sim, do lobo. E devem consumir arte. O Projeto GOMPA fez um trabalho impecável. De atuação e narrativa, de composições com um minimalismo de cenário que enchem o palco – e de um trabalho de luz e sombras fenomenal. Envolve a plateia, pega o palco italiano, de contemplação, e joga na vivência, traz a dança e a singeleza de movimentos concatenados que transformam um aparato de metal em casa, cozinha e covil. Próxima vez que aparecer por aí, não perca! Texto: Gustavo Türck / Fotos: divulgação (capa) e Têmis Nicolaidis (internas) A apresentação dessa segunda-feira, 15 de julho, fez parte do 3º FESTECRI (Festival de Teatro para Crianças). Sinopse:Vencedor de 24 prêmios e com mais de 65 indicações, incluindo o Troféu CENYM 2019, pela primeira vez no Brasil é encenado o texto Chapeuzinho Vermelho de Joël Pommerat, um dos nomes mais relevantes da dramaturgia contemporânea mundial. Com linguagem híbrida, que mescla teatro, dança e música, o espetáculo dirigido por Camila Bauer é uma experiência que encanta crianças e adultos, com uma proposta de distintas camadas de percepção. O texto de Joël Pommerat, reconhecido por suas narrativas líricas e instigantes que, nesta obra, traz à tona uma espécie de “iniciação ao medo”, como o autor mesmo define, em que a criança se depara com os riscos e, ao mesmo tempo, o fascínio pelo desconhecido representado pela estrada – ou, metaforicamente, a própria passagem da vida infantil à adulta. Classificação etária: 7 anosDuração: 55 minutos EquipeTexto: Joël PommeratTradução: Giovana SoarDireção: Camila BauerElenco: Fabiane Severo, Guilherme Ferrêra, Henrique Gonçalves e Laura HickmannDireção coreográfica: Carlota AlbuquerqueComposição e desenho sonoro: Álvaro RosaCostaPreparação vocal: Luciana KieferCenografia: Élcio RossiniFigurino: Daniel LionIluminação: Thais AndradeMaquiagem: Luana ZinnCriação e confecção de máscara: Diego SteffaniCriação e confecção de gobos: Pedro LunarisIdentidade visual: Jéssica BarbosaFotografias: Adriana MarchioriTeasers: Camino FilmesPsicólogos colaboradores: Sahaj, Camila Noguez e Pedro LunarisProdução: Projeto Gompa e Rococó Produções Artísticas e CulturaisRealização: Projeto GOMPA

Preto, poético e político

O famoso “soco no estômago”.Para homens brancos em constante procura de sua identidade, sua história, se aberto às reflexões, o soco expõe as víceras.Foi assim que desenvolvi meus sentimentos ao assistir a “WOYZECK, PRETO-POÉTICO-POLÍTICO”.Descendente de alemães, portugueses… a peça era para mim. “Nós, europeus,” somos expostos de uma maneira maravilhosa – mesmo que eu não me considere isso – sou brasileiro! -, mas sou literalmente enquadrado, com muita razão, inclusive.É uma obra de narrativa que expõe a construção de uma parte bem significante do racismo estrutural que se vive hoje – centenas de anos depois. O positivismo de Augusto Comte, importado pelo republicanismo e que deu ares ufânicos ao gauchismo “histórico”, tradicional, está ali. A teoria do embranquecimento da população… Está ali! E… Você sabia que isso existiu?! (Detalhe: eu não conheço Woyzeck, não precisa conhecer Woyzeck, a história é a nossa).Um texto de autor levado ao palco, com a fibra de seus executores à mostra. Cenário minimalista, mas que se enche de luzes e sombras bem apresentadas. De atuações que precisam se destacar – e se destacam. A peça é uma obra que merece arenas lotadas – e as lágrimas que derrubei.Sempre é muito difícil trabalhar com as saídas da estória para a história, a quebra da chamada 4ª parede, o determinante que torna, na frente da plateia, o personagem em pessoa – e eles fazem isso muito bem! Como parte que se enquadra em toda uma narrativa adaptada ao nosso tempo/lugar.Meu subjetivismo branco, pequeno-burguês, estava contemplado no seu cutuco, que constantemente procuro manter. Mas é uma peça nova, uma obra em desenvolvimento – e isso também é lindo de enxergar. Quem consegue observar o espaço de evolução que existe ali, curte mais ainda a produção. Um trabalho de alma das atuações de Yannikson, Mayura Matos, Eduardo Arruda, Rita Réus, Felipe Fiorenza, Sílvia Duarte, Alexander Kleine e Anderson Gonçalves, da encenação de Eduardo Arruda e Mayura Matos, e da produção de Dirce Maria Orth, de Ponto de Cultura, proveniente de pequeno município, mas de grande visão. (ficha técnica completa ali abaixo) Meu racionalismo artístico quer ver a obra de novo, com 30 minutos a menos, com os personagens em dinâmicas mais afinadas de entradas e saídas e com o som de suas vozes não destacados para baixo do áudio mecânico, produzido – “pausa para o momento homem branco crítico de arte aqui”, meu lugar de fala. Mas quer saber?! Vale a pena já do jeito que está! Eu não sou referência de nada, a não ser da satisfação de meu próprio ego… Parabéns aos envolvidos. E sigam! Ficha TécnicaDramaturgia: Georg BüchnerAdaptação dramatúrgica: Eduardo ArrudaEncenação: Eduardo Arruda e Mayura MatosElenco: Yannikson, Mayura Matos, Eduardo Arruda, Rita Réus, Felipe Fiorenza, Sílvia Duarte, Alexander Kleine e Anderson GonçalvesDireção musical / trilha sonora original: Felipe FiorenzaFigurinos: Carmem Arruda e Eduardo ArrudaConfecção de figurinos: Carmem Arruda, Rita Oliveira e Eduardo ArrudaCenografia: Eduardo ArrudaInterpretação / teclado da trilha sonora: Adriano KleemannGravação e edição musical da trilha sonora: Marcello MelloCriação de luz: Leandro GassOperação de luz: Leandro Gass e Haik KhatchirianOperação de som: Aterna PessoaEdição musical e efeitos sonoros: Alexander KleineMaquiagem: CoadjuvantesComposição original música “Voz ancestral”: Grupo AfroentesEdição da música “Voz ancestral”: Mayura MatosConstrução do intonarumori: Silvio Germano WesterhoferComposição original da música “Violinos em delírio”: João Batista SchmidtTexto “Ária Yannikson”: YanniksonTexto “Ária Mayura”: Mayura MatosVoz da performance: Clélio CardosoMídias sociais: Kelvin Prudêncio e YanniksonFotografia: Dani ReisMaterial gráfico: Eduardo ArrudaProdução: Dirce Maria Orth, Eduardo Arruda e YanniksonAgradecimentos: Goethe-Institut Porto Alegre, CCBB, Fora da Asa – Experiências PluraisCo-realização: Goethe-Institut Porto AlegreRealização: Coadjuvantes Aqui o release da peça: TEMPORADA DE ESTREIA 🎭 Semana de estreia de Woyzeck: preto – poético – político! Trabalho de estudo e pesquisa do grupo Coadjuvantes nos últimos anos, o espetáculo terá suas primeiras apresentações no teatro do @goetheinstitut_portoalegre! Os ingressos já estão disponíveis pelo link (https://bit.ly/woyzeck-preto-poetico-politico) e também podem ser adquiridos com os integrantes do elenco. Reserve a data e garanta já o seu! SINOPSE:O espetáculo “Woyzeck: preto – poético – político” é uma criação contemporânea que traz, em sua temática principal, a história de Woyzeck: um homem preto submetido a diversas experimentações científicas, sociais e comportamentais. Questionador de sua natureza enquanto indivíduo e ser repleto de subjetividades, é ao lado de Marie que Woyzeck vai descobrir os limites das atrocidades humanas, vivenciando, na própria pele, os resquícios de um sistema que é continuamente alimentado para não estar ao seu favor. Nesta história, personagens como o Capitão, o Médico, o Tamboreiro e a Beata surgem como imponentes símbolos de manutenção do racismo e dos privilégios da branquitude na nossa sociedade. woyzeck #espetaculoteatral #projetobuchner #teatro

Silêncio que atordoa

O silêncio de cada um de nós, com as violências que nos atingem individualmente, pode nos matar um pouco a cada dia. O silêncio coletivo, em relação às injustiças sociais, nos matam coletivamente, o presente e o futuro do nosso povo. Ouça o comentário de leonardo melgarejo: Aqui o link para texto no Brasil de Fato: https://www.brasildefators.com.br/2023/06/30/o-silencio-atordoa

Travessia

O comentário dessa semana é sobre o discurso de Lula. Sobre este tema, como disse nosso amigo Renato Barcelos, Lula no Encontro de Paris, fazendo aquilo que sabe fazer com maestria: um entusiástico discurso político. Foi o único a ser aplaudido durante sua fala e ao final da fala foi o mais aplaudido de todos os chefes de governo. Ouçã o comentário de leonardo melgarejo: Abaixo, o link traz o discurso em português: Leonardo Melgarejo é membro do Movimento Ciência Cidadã, colaborador do Coletivo Catarse e colunista do Brasil de Fato/RS.

Demarcação Já! Parte 2

Essa semana escutei alguém comentando que a verdadeira capital deste planeta, aquele local onde as decisões mais importantes estarão sendo tomadas a cada instante, é hoje algo que se espalha por todos os cantos da Amazônia. Esta me pareceu uma boa síntese para o que se passa neste momento histórico, que o historiador e professor Luiz Marques chamou de “o decênio decisivo”. Também disponível para leitura no link: https://www.brasildefators.com.br/2023/06/09/demarcacao-ja Leonardo Melgarejo é membro do Movimento Ciência Cidadã, colaborador do Coletivo Catarse e colunista do Brasil de Fato/RS.

Um outro fim de mundo é possível! – Demarcação Já!

As cercas nos controlam? Na Semana Mundial do Meio Ambiente nada parece mais relevante do que a destruição causada pelos cercamentos a que nos submetemos. Cercas físicas, que permitem a apropriação privada e a concentração obscena dos territórios, com suas implicações sobre a fome e a miséria crescente de centenas de milhões de pessoas. Acesse o link e ouça o comentário de Leonardo Melgarejo Também disponível para leitura nos links: E ainda em: https://www.brasildefators.com.br/2023/06/09/demarcacao-ja Leonardo Melgarejo é Engenheiro Agronômo pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1976), mestrado em Economia Rural pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1990) e doutorado em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina (2000). Foi representante do Ministério do Desenvolvimento Agrário na CTNBio (2008-2014) e presidente da AGAPAN (2015-2017). Faz parte da coordenação do Fórum Gaúcho de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos (2018/2020 e 2020-2022) e é colaborador da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida, do Movimento Ciência Cidadã e da UCSNAL.