Ele voltou! E vai para a 2ª Carijada Serrana em São Chico

Após algumas semanas aos cuidados do amigo e médico veterinário Fabio Haussen, que o resgatou das águas da enchente do Rio Taquari – que acometeu sua morada em Triunfo -, o soque de erva-mate do Coletivo Catarse passou por uma “internação” nas mãos do marceneiro Juca Rocha, ali mesmo, no bairro Olaria, e… voltou a funcionar! Depois desse processo de recuperação, deve chegar em São Francisco de Paula um dia antes da carijada marcada para passar por uma limpeza profunda e ajustes finais, quando ficará à disposição para voltar a bater erva novamente. Esta que será a 2ª Carijada Serrana do Caconde, já contando com muita gente inscrita e que vai ocorrer entre os dias 26, 27 e 28 de julho. Um evento que marca também os 20 anos do Coletivo Catarse e os 10 anos do lançamento do documentário Carijo! Para mais informações, clique aqui e leia a matéria original de divulgação da carijada. Confira mais imagens da recuperação do soque, que passou (e vai passar mais um pouco) por troca e limpeza de rolamentos – da estrutura de madeira e do motor (que ficou uma semana embaixo da água e voltou a funcionar!) -, limpeza e refeitura do cocho da erva-mate, afiação das lâminas, mais uma desinfecção e lubrificação geral. *Texto de Gustavo Türck e fotos e vídeo de Bruno Pedrotti e Billy Valdez.

Em 2024, o maior desafio da chapeuzinho vermelho não é o lobo mau, mas uma plateia cheia de pré-adolescentes

Numa tarde de segunda-feira, no Teatro São Pedro, aconteceu sessão da peça Chapeuzinho Vermelho, uma adaptação de premiado texto de Joël Pommerat, realizado pelo Projeto GOMPA. Na sinopse, há a menção de que a releitura contemporânea traz à tona uma espécie de “iniciação ao medo”. E é verdade! Só que… Não só ao medo para pequenas crianças, que estavam presentes aos montes – e que adoraram, mesmo que algumas tenham sido retiradas da plateia no colo nos sustos óbvios que viriam do lobo mau. Totalmente natural, reações normais e certamente esperadas, que não prejudicam em nada a proposta do espetáculo. Agora… Para pais e mães de pré-adolescentes – como este que escreve e aquela que tirou as fotos desta resenha – a sessão foi de tremenda tensão. Meninas e meninos impassíveis, impossíveis de ficarem em silêncio ou sentadas quietos por mais de uma dezena de minutos, conversas, cochichos, deboches de todos os lados, caras de nojo e uma pífia participação afogada pela grande interatividade dos pequenos, que cantaram antes, assustaram-se durante e aplaudiram depois. Apenas no ápice da linguagem metafórica apresentada pela peça, de forma muito inteligente, a trazer os perigos dos “lobos maus” da vida real, com frases do tipo “deita aqui”, “vem para baixo do cobertor” e “eu vou te comer” – totalmente coerentes com as interpretações e contextos -, a reação uníssona da turba dos 12, 13 anos, que tomou conta sobre todas as vozes, foi de chiste, de onomatopéia gracejosa, nada grave. O que faz gerar isso? Por que para os pequenos o medo do lobo mau foi evidente, de pulos em cadeiras, gritos de espanto, mas para as meninas e meninos no limiar da puberdade foi de humor sexualizado? Há muitos aparelhos ligados procurando redes roteadas acessando informações descontroladas por pessoas jovens sem limitações – porque pode ser, inclusive, impossível. A sensualização da inocência está aí, a cada clique, em cada som, nas imagens que minha filha de 10 anos, por exemplo, já acessa em seus dispositivos com certo controle. É muito difícil – e vai ficando pior com o que vem acontecendo no compêndio ideológico-legal em disputa no Congresso e nas ágoras do poder brasileiro. E isso complica a luta contra o abuso, contra a violência sexual em crianças e adolescentes. Pode, invariavelmente, confundir a mensagem. Me apavorei. Mas também me encantei. Talvez um bom público-alvo para esta obra seja exatamente o de pessoas com um hiato etário, evitando-se pessoas dos 12 aos 18 anos, trabalhando-se as pontas para melhorar a compreensão no meio – e não por causa do texto trabalhado de forma excelente pelos autores, mas pela conjuntura da nossa atualidade. E pais e mães – sozinhos – também precisam acessar essas metáforas, também precisam se identificar nos papeis da mãe, da vovó e, sim, do lobo. E devem consumir arte. O Projeto GOMPA fez um trabalho impecável. De atuação e narrativa, de composições com um minimalismo de cenário que enchem o palco – e de um trabalho de luz e sombras fenomenal. Envolve a plateia, pega o palco italiano, de contemplação, e joga na vivência, traz a dança e a singeleza de movimentos concatenados que transformam um aparato de metal em casa, cozinha e covil. Próxima vez que aparecer por aí, não perca! Texto: Gustavo Türck / Fotos: divulgação (capa) e Têmis Nicolaidis (internas) A apresentação dessa segunda-feira, 15 de julho, fez parte do 3º FESTECRI (Festival de Teatro para Crianças). Sinopse:Vencedor de 24 prêmios e com mais de 65 indicações, incluindo o Troféu CENYM 2019, pela primeira vez no Brasil é encenado o texto Chapeuzinho Vermelho de Joël Pommerat, um dos nomes mais relevantes da dramaturgia contemporânea mundial. Com linguagem híbrida, que mescla teatro, dança e música, o espetáculo dirigido por Camila Bauer é uma experiência que encanta crianças e adultos, com uma proposta de distintas camadas de percepção. O texto de Joël Pommerat, reconhecido por suas narrativas líricas e instigantes que, nesta obra, traz à tona uma espécie de “iniciação ao medo”, como o autor mesmo define, em que a criança se depara com os riscos e, ao mesmo tempo, o fascínio pelo desconhecido representado pela estrada – ou, metaforicamente, a própria passagem da vida infantil à adulta. Classificação etária: 7 anosDuração: 55 minutos EquipeTexto: Joël PommeratTradução: Giovana SoarDireção: Camila BauerElenco: Fabiane Severo, Guilherme Ferrêra, Henrique Gonçalves e Laura HickmannDireção coreográfica: Carlota AlbuquerqueComposição e desenho sonoro: Álvaro RosaCostaPreparação vocal: Luciana KieferCenografia: Élcio RossiniFigurino: Daniel LionIluminação: Thais AndradeMaquiagem: Luana ZinnCriação e confecção de máscara: Diego SteffaniCriação e confecção de gobos: Pedro LunarisIdentidade visual: Jéssica BarbosaFotografias: Adriana MarchioriTeasers: Camino FilmesPsicólogos colaboradores: Sahaj, Camila Noguez e Pedro LunarisProdução: Projeto Gompa e Rococó Produções Artísticas e CulturaisRealização: Projeto GOMPA

Caos e Lama

No último dia 6 de julho, acontenceu O evento “Caos e Lama”, mais um entre muitos que vêm acontecendo no Rio Grande do Sul em prol dos atingidos pelas enchentes e chuvas do mês de maio de 2024, que assolaram o estado, literalmente nos colocando em caos e lama. Este evento em particular foi articulado em coletivo com as bandas Diokane, Välika e Death to Lovers e contou com apoio do estúdio Musicbox. O “Caos e Lama” teve objetivo de levantar apoio financeiro para as familias de Rafael Giovanoli, guitarrista da Diokane, e Izza Strange, vocalista da banda Välika, ambas famílias que residem na cidade de Canoas e tiveram suas casas atingidas pelas enchentes, perdendo praticamente tudo. No evento, foi arrecadado um montante de R$ 2.000,00, que foi dividido entre as duas famílias, um recurso financeiro que aparentemente não é muito, mas, no contexto geral da perdas imensas, é de grande ajuda para ambos. Apesar da noite muito fria na cidade de Porto Alegre, dentro do estúdio Musicbox, o calor gerado pelo som barulhento das bandas e agitação da galera esquentou as almas dos amantes da cultura underground. Conheça um pouco das bandas.

No Centro da cidade, um Sarau das matas.

No sábado, dia 22 de junho, aconteceu o Primeiro Sarau das Agroflorestas, no Espaço Cultural Maria Maria. Esse encontro de música e poesia proporcionou a interação presencial de diversas pessoas que ajudaram a construir a Carta das Agroflorestas, um documento que reuniu inicialmente 405 assinaturas e apresenta propostas para reconstrução do Estado por meio dos sistemas agroflorestais.

Cobertura internacional das enchentes no RS

Durante o mês de maio, o Coletivo Catarse recebeu a visita do jornalista independente Michael Fox – profissional estadunidense com histórico de coberturas na América Latina e atual responsável pela série em podcast Under The Shadow (sabe inglês? ouça aqui!), produzida em parceria com o Coletivo e que conta a influência e exploração do imperialismo estadunidense sobre a América Central. Numa volta que envolveu idas a bairros de São Leopoldo, Canoas, Centro da capital e ilhas, produziu-se em conjunto diversos materiais sobre as enchentes, que foram veiculados em diferentes canais de mídia mundo afora. A recorrida se iniciou em um domingo, passando-se pela Rua Washington Luiz, indo-se até as margens do Guaíba, adentrando-se ruas de praia adentro – já bastante esvaziadas, mas ainda com muitos resquícios como um fundo de lago que virou a região por muitos dias. Do primeiro movimento surgiu materia para a Al Jazeera, contando a história das pessoas e lugares atingidos – a dona da papelaria, ao lado do colégio particular, sem energia elétrica ainda, que perdeu praticamente tudo; os donos de pequenos comércios, um bar e uma lanchonete, moradores da rua, que ficaram sobre as mesas por dias a fio para cuidar de seus negócios; dos pescadores das ilhas, sem mais o que pescar; os afogados de um bairro inteiro que ficou 5m embaixo d’água; e os prédios e caminhos históricos no meio disso tudo: https://www.aljazeera.com/economy/longform/2024/6/11/the-future-is-dark-inside-the-brazilian-businesses-shattered-by-floods Um dos desdobramentos que Michael Fox reportou foi os problemas de saúde pública que começavam a aparecer. Na ida às ilhas, acompanhando um médico, viu-se um atendimento precário, mas necessário. Conversas sobre leptospirose, micoses e outros enjoôs foram constantes, fosse cruzando o Guaíba ou nos abrigos visitados – como um com mais de 500 pessoas em São Leopoldo. https://theworld.org/stories/2024/06/18/as-flood-waters-drop-brazil-faces-a-waterborne-disease-outbreak A cidade, que comemoraria 200 anos da imigração alemã logo ali, em 25 de julho, teve muitas áreas inundadas pela superação dos diques do Rio dos Sinos – um curso de água tão mais conhecido por sua escassez nas últimas décadas do que por suas cheias. O prédio da prefeitura ficou com seu primeiro andar completamente alagado, mas, nesse dia de visita, conseguimos acessar em meio à limpeza os andares superiores para uma conversa com o prefeito Ary Vanazzi. Este acompanhamento gerou um material para uma rede de televisão turca: Michael ainda deu a “sorte” de presenciar o nascimento de uma ocupação – na vizinhança da Comuna do Arvoredo, sede do Coletivo Catarse, na Rua Fernando Machado, surgiu a Ocupação Desabrigados da Enchente. https://truthout.org/articles/climate-refugees-are-occupying-abandoned-buildings-in-southern-brazil Como bom estadunidense que é, também cobrindo para um programa de rádio pública de seu país natal, de notícias globais, o tema “aeroporto” está sempre em voga – uma ida a um shopping em Canoas para presenciar as retomadas dos voôs partindo da região metropolitana de Porto Alegre. Azul, Latam e Gol usando um espaço e o saguão ao lado de uma pista de patinação no gelo para embarcar até a Base Aérea de Canoas pessoas que estavam com suas passagens remarcadas de longo tempo, presas, com destinos como São Paulo, Recife, Rio e Equador. https://theworld.org/stories/2024/06/06/a-city-in-southern-brazil-is-forced-to-adapt-after-floods-shut-down-a-major-airport Mike, mesmo sendo from USA, não voltaria mais ali – para Canoas, substituindo o Salgado Filho. Mesmo sendo estadunidense, pegou um Uber de retorno a Osório, onde embarcou em um bus a Floripa e vem mandando todo o seu trabalho captado e processado, enquanto planeja mais uma volta no futuro – que pode vir a ser Alaska, no caminho, agora, contando as histórias de como o Império agiu e como foi a resistência na nossa América do Sul – isso, então, para uma segunda temporada de Under The Shadow. To be continued… Texto: Gustavo TürckFotos: Billy Valdez, Michael J. Fox (sim, este é o nome dele) e Gustavo Türck

Recuperar o soque para simbolizar a superação

As enchentes no RS atingiram não só diretamente as vidas de pessoas e animais, mas também os objetos, os projetos, as atividades, planos… os diversos futuros. Em Triunfo, há cerca de 500m de distância da margem do Rio Taquari, a residência de um parceiro do Coletivo Catarse foi atingida completamente. Uma área no tranquilo bairro Olaria, fora do centro urbano, mas bem habitada, no estilo vila bucólica. A casa e a estrutura de trabalho da família, um tipo de gleba, com pequena agrofloresta, cheia de frutíferas e outros manejos, ficaram completamente sob as ferozes águas das cheias, que chegaram escoadas em um rio já quase sem mata ciliar em suas margens – uma das razões diretas do absurdo que se viveu na região. O médico veterinário Fabio Haussen e sua companheira, a psicóloga Andreia Vasques (insta: @psico.andreiavasques), agora se dividem na recuperação de suas estruturas e no auxílio à comunidade e ao município – já que fazem parte de uma frente de solidariedade que não vai parar ainda por um bom tempo. A ligação desta família com o Coletivo Catarse vem de algum tempo já. Por certa proximidade e por ter um gosto ligado à cultura do gaúcho, Fabio já participou de duas carijadas realizadas pelo Coletivo – seu sítio, no interior do município, mantém um erval, ao qual teve duas podas cedidas aos eventos, uma em 2016 e outra ano passado, em 2023. Aqui neste link é possível observar todo o processo da produção artesanal de erva-mate que se fez, demonstrado em texo, fotos e vídeo, com as imagens da colheita à pilagem. A pilagem… Foram moídos ali, então, cerca de 25kg de erva, num soque adquirido pelo Coletivo Catarse durante o projeto Roda Carijo em 2015, que acompanhou diversas carijadas ao longo dos anos, apoiando amigos e parceiros ou batucando em eventos próprios, produzidos pelo próprio Coletivo. Numa nova fase de realizações destes eventos, pós um período inerte de pandemia, esta ferramenta pesada já havia circulado alguns bons quilômetros – e se planejava, num futuro bem recente, fazê-lo andar ainda mais. Então, nesta parceria com a família de Fabio, após a I Carjada Kaatártica em Triunfo, decidiu-se por armazenar o soque na casa às margens do Rio Taquari – sob a espectativa da realização, num próximo período, de pelo menos mais duas carijadas. Infelizmente, como mais uma vítima das enchentes – mas jamais igualada em sofrimento com quaisquer das vidas atingidas por tamanho desastre -, o soque ficou completamente embaixo d’água. Agora, Dr. Fabio e o Coletivo Catarse vão, juntos, tentar recuperar esta ferramenta simbólica, fazê-la bater erva novamente e já planejar um novo encontro de carijada para representar uma superação necessária. Amigos e parceiros que não se entregarão ao infortúnio, mas de jeito nenhum! Reportagem: Bruno Pedrotti e Gustavo Türck (texto)Fotos: Billy Valdez Confira uma pequena galeria:

Ocupação Residencial Arvoredo

Na sexta, 24 de maio, 60 famílias atingidas pelas enchentes do Rio Grande do Sul ocuparam o antigo Hotel Arvoredo. Localizada na Rua Fernando Machado, Centro Histórico de Porto Alegre, a ocupação luta para seguir no local e manter a dignidade das famílias na reconstrução depois da catástrofe.

Organizações pela soberania popular no combate à catástrofe

Apesar do tempo nublado com momentos de garoa e do vento sul gelado (que fazia a sensação térmica parecer bem menor dos 12 C que a temperatura marcava), o sábado dia 25 de maio foi um dia de mobilização intensa. Tanto nos espaços centrais quanto nas periferias de Porto Alegre, grupos diversos de pessoas se juntaram para combater a capitalização da catástrofe que atinge o RS e pensar alternativas locais que levem em conta a ciência e as demandas dos territórios.

Movidas, ações e articulação em solidariedade às atingadas e atingidos pelas enchentes no RS

Desde o início de maio, o Estado do RIo Grande do Sul enfrenta um evento extremo ligado ao colapso climático e às péssimas gestões ambientais e de prevenção de cheias dos governos em todos os níveis. O modelo econômico empregado na região tem contribuído tanto com o sucateamento de órgãos e estruturas públicas de resposta a emergências do gênero como também com o desmatamento e outras fontes de emissão de CO2 – o que tem tornado mais comuns ciclones e outros eventos extremos nesta área do continente sul-americano.