Choveu bomba em Porto Alegre

Há um território proibido para todo manifestante em Porto Alegre. Fica na Avenida Ipiranga, esquina com a Avenida Érico Veríssimo, sede da RBS. A Brigada Militar guarda este espaço como se nele batesse o seu próprio coração. Como cães treinados, os policiais avançam contra qualquer “estranho” que se aproxime do pátio onde descansam e traquinam seus donos. A imagem é uma alegoria, mas representa o que tem acontecido.

Ontem, 20, até a marcha chegar no limite deste território de exclusão, nem sequer uma lata de lixo foi virada pelo caminho. Como o povo não desistia de seguir pela avenida, como faz em qualquer outra parte da cidade, inclusive na frente da Prefeitura e do Palácio Piratini, a Brigada fez chover bombas de gás sobre os manifestantes. Dessa forma, observamos que a opção pela violência foi da Brigada Militar. Tudo o que se seguiu, portanto, pode-se atribuir à revolta que toma conta de quem é atacado – neste caso, pela polícia.

Dezenas de pessoas passaram mal. Na multidão, correndo em retirada, considera-se pura sorte alguém não ter sido pisoteado com gravidade. Havia ainda quatro helicópteros sobre as ruas, às vezes jogando luz sobre os manifestantes. Um clima de repressão e opressão que faz lembrar períodos do passado.

As marchas estão completamente infiltradas por policiais da inteligência, fotografando e identificando militantes dos movimentos sociais para depois possivelmente criminalizá-los. Identificam também repórteres independentes, que, através do seu trabalho, ajudam a furar o bloqueio da mídia sobre a verdade das mobilizações sociais que lutam por uma outra sociedade em que poucas pessoas não dominem e explorem a maioria.

E parece que o governador do estado não tem poder sobre a sua polícia, porque, em reunião com integrantes de movimentos populares, horas antes do ato, não garantiu que a mesma não agiria com violência.

E a Brigada Militar agiu mais uma vez. Seguiu a irresponsabilidade das balas de borracha, das bombas de gás e da cavalaria contra o povo que se manifesta. É orientação de Governo fazer barricada para que manifestantes não passem em frente à RBS? Ou a Brigada decidiu sozinha fazer a proteção deste prédio, mais do que faria para qualquer outro, público inclusive? Não é especulação, é fato que jornalistas da RBS conversam e passam materiais para representantes da Brigada Militar durante as manifestações. Presenciamos isso, pelo menos duas vezes este ano.

Esta é a mídia que criou uma histeria coletiva nítida sobre as manifestações, fazendo com que a cidade parasse horas antes, espalhando medo na população e ajudando a formar uma opinião de repulsa à parte dos manifestantes que trouxe esta luta para as ruas.

Por outro lado, foi uma marcha diferente das anteriores. As pautas originárias do movimento que tomou as ruas do país por um transporte público e de qualidade e contra as violações de direitos humanos cometidas em nome da Copa, neste 20 de junho, ganharam outras. Muitos se sentiram chamados para as ruas, outros foram chamados de forma organizada e planejada para plantar dentro deste movimento popular uma tentativa de golpe de Estado.

Havia reivindicações genéricas contra a corrupção dos políticos, pauta tradicionalmente utilizada por setores reacionários da sociedade quando querem substituir um governo por outro de sua maior simpatia. Agora, se a grande mídia e os setores de direita, com os quais a mesma se identifica, pensam em aproveitar esta energia toda para criar um atalho de chegada ao poder, cabe seguir a reflexão se a mobilização que gerou todo este movimento que está aí tomando as ruas do Brasil sabe ao certo para onde vai e se também resistirá a este tipo de cooptação.

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