Rogério Mattos
Se, antes, eram as empreiteiras e construtoras que levavam a fama por serem bases operantes para a corrupção do erário publico, hoje, essa imagem passa a ser associada a agências de publicidade e à própria publicidade em si. Frases como “pra quê gastar dinheiro com propaganda se a gente não tem saúde e educação”, “bando de publicitário ladrão”, ou “acho que vou ser publicitário, ganhar grana falando mentira” são, de forma preconceituosa, ditas pelas pessoas sem nenhuma culpa, desassociando a profissão da responsabilidade e da importância a ela inerente. O que sobra é o pressuposto desmoralizante da comunicação publicitária, sinônima de entidade sem glamour, mas de poder, luxo e lixo, e a pergunta: é válida a comunicação e as propagandas feitas pelas instituições e empresas públicas?
O tripé da saúde pública é saneamento, nutrição e educação sanitária. Saneamento é estrutura, precisa-se, então, para melhorar a saúde da população, de se construir canais de esgoto, usinas de tratamento, etc. Para uma boa nutrição da população é preciso um país que possibilite uma variedade razoável de alimentos a preços acessíveis, com distribuição gratuita de comida para os mais necessitados e impossibilitados de trabalhar, para as crianças nas escolas, e uma boa educação alimentar para não termos uma população doente com a obesidade, por exemplo. A educação sanitária se faz nas escolas, com livros e com bons professores, se faz na família e na sociedade através de sua herança cultural, passada pelo folclore, pelo diálogo e pelo cotidiano; e se faz com veículos de comunicação e outros suportes. Investir em estrutura é ação de uma política pública. Garantir o setor produtivo e agrícola para fornecer bons alimentos é uma ação de política pública. Comunicar os conhecimentos que ajudem a sociedade a ter uma boa educação sanitária é política pública.
Quanto vale uma campanha propagandista para o estado do Rio Grande do Sul que ensine as crianças e adultos a tomar soro caseiro e a explicar o que é a dengue e o ciclo reprodutivo do mosquito que a transmite? Com dez milhões de habitantes no estado, uma veiculação de 30 segundos no horário do Jornal Nacional da Rede Globo custa R$21.066,00. Um anúncio de meia página no jornal ZH não sai por menos R$10.000,00. Fazer um jornal independente, informativo, tamanho tablóide, de oito páginas, todo colorido, com diagramação, planejamento gráfico, equipe de jornalistas, de produção, com cinco profissionais, justamente remunerados, tiragem de cinco mil exemplares e distribuição dos mesmos, não sai por menos de R$10.000,00. Cinco mil exemplares? Quantos habitantes têm no estado mesmo? Antes que alguém largue este texto e saia elaborando um plano de mídia, e com o pressuposto que comunicação do estado é política pública, podemos concluir que a publicidade, a ou comunicação, num primeiro impacto, é um investimento caro. Contudo, esse investimento gera centenas de milhares de empregos e retorna, consideravelmente, em forma de impostos para a União.
Qual a importância de um professor, de um médico e de um comunicador? Qual das três profissões pode matar ou salvar em virtude de seus atos, de seus erros e de seus acertos? Quem deve ser mais remunerado? São respostas difíceis. No entanto, qualquer sílaba dita tem como pano de fundo uma discussão ética da essência do capitalismo, em que o dinheiro moeda absorveu a representação de qualquer tipo de riqueza material. O materialismo e o acúmulo de dinheiro são hoje dois valores importantes em nossa sociedade, determinando a ambição do ser humano em ser, ou não, bem remunerado, rico, etc. Essa discussão sobre a devida remuneração que um comunicador deve receber, podemos aprofundar numa outra oportunidade. No entanto, para termos um panorama geral, pela regra de mercado, há o repasse de 20% dos veículos de comunicação para as agências de publicidade. E é desse repasse que, teoricamente, vem a remuneração dos profissionais nas grandes licitações públicas, anunciadas nos veículos da grande imprensa. Numa licitação de dez milhões de reais, dois milhões ficam para quem criou e planejou a campanha, sem contarmos os gastos de produção que podem ou não estar nesse repasse. O Fato é que a comunicação do estado com sua população é um bem público, por isso não podemos deixar que caia na mão de aproveitadores e corruptos.
Novas agências de comunicação, em diferentes formas de organização jurídica com novos profissionais preparados e competentes, devem continuar surgindo, independentemente, de todas as adversidades, deixando de lado qualquer tipo de vislumbre da profissão, mas mantendo a vontade de mudar, de trabalhar, de serem remuneradas e de serem valorizadas. Essa crise que escalpela o nosso país serve para que os comunicadores tenham a iniciativa ainda maior de se preparar para servir a administração pública que é extremamente exigente em suas licitações.
Classificar como bem público a comunicação do estado com sua população é imprescindível para discutirmos outros temas como o lucro abusivo de empresas com a comunicação pública; a justa remuneração de um profissional de comunicação pelos órgãos públicos; alternativas para um trabalho de qualidade na comunicação do estado; e a verdadeira importância do profissional de comunicação, para a sociedade, dentro da máquina estatal.
Para finalizar, não podemos esquecer que vulgarmente se diz que propaganda quem faz é governo, e que publicidade quem faz é o mercado. A comunicação publicitária ou propagandista pode ser usada por uma ideologia, mas não é ideológica. Propaganda e publicidade são a mesma coisa e podem ser usadas por qualquer um. Agora fica a pergunta: será esse conceito que faz hoje os políticos serem apresentados como produtos a seus eleitores? Está aí outro tema a ser debatido.