Manobras diversionistas Ao reduzir décadas de crise no sistema de saúde, ao suposto não cumprimento da carga horária pelos médicos, o prefeito Fortunati presta um desserviço à população de Porto Alegre e do RS. O prefeito sabe, melhor do que qualquer um de nós, que os problemas existentes no sistema de saúde transcendem completamente essa questão particular. A superlotação das emergências, as filas nos postos de saúde; a demora de meses ou de anos para garantir uma internação hospitalar ou uma consulta especializada; a deterioração dos prédios; a deficiência de serviços de apoio diagnóstico e terapêutico; o déficit de profissionais; os baixos salários e as condições precárias de trabalho, enfim, o abandono, o desfinanciamento e o desmonte dos serviços de saúde em Porto Alegre e nos demais municípios do RS, por certo, não são de responsabilidade dos profissionais médicos contratados pelo município. Esse quadro calamitoso é o resultado de uma política deliberada de desqualificar os serviços estatais em favor dos serviços privados, fortemente subsidiados pelo Estado. É isto que está em questão, e não o cumprimento ou descumprimento da carga horária pelos médicos. Jogar a população contra os médicos, não vai ajudar a construir o Sistema Único de Saúde. Caso uma parcela deles não cumpra contrato de trabalho, existem medidas administrativas para corrigir este fato. “Demonizar” os médicos, fazendo vista grossa para a complexidade dos problemas reais, é uma fórmula fácil e rasteira de tentar resolver a questão. Primeiro você nocauteia os serviços públicos, abandonando-o à sua própria sorte e, na seqüência, apresenta uma fundação de direito privado, como a solução para um problema que você mesmo criou. Aos olhos da população, e parece que é isso que os “gestores públicos” pretendem, os funcionários públicos (estatutários), não trabalham, assim como o Estado não funciona, é moroso, pesado e corrupto. Nós defendemos a primazia dos serviços estatais na área da saúde operados por um Estado voltado para satisfazer os interesses da maioria da população. O setor privado entra residualmente e com suas próprias pernas, sem subsídios públicos. Hoje, somados subsídios diretos e indiretos, o setor privado deve receber um valor equivalente à metade dos parcos recursos que o setor público disponibiliza para financiar a saúde. O mínimo que se quer é que o debate seja franco e honesto, com todas as variáveis colocadas na mesa. Só assim poderemos cogitar de construir um sistema de saúde público digno e de qualidade. Lucio Barcelos – Médico SanitaristaJaneiro de 2011. O Coletivo Catarse produziu, em 2010, uma reportagem especial sobre as filas nos postos de saúde de Porto Alegre, com apoio do SIMERS, SINDSPREV/RS e ASERGHC. Uma cópia da versão de 48 minutos pode ser solicitada. Aqui, um trailer: