O Natal passou e…

Por Eliana Mara Chiossi.

Epígrafe:
Fevereiro já está no horizonte
e a passagem do tempo
que conheço
passa veloz
num carro vermelho.

Fevereiro é o mês adiante
e meus passos estão
na estrada
aguardando a carona
…do carro vermelho
e do sorriso da vida,
sorriso matreiro,
sorriso danado,
me olhando e
sabendo
que fevereiro está
no meu horizonte
que é feito de instantes duvidosos.

O Natal passou. E isso é um alívio. Não só para mim. Aquele tempo artificial de presentes e compras e expectativas deixou de pressionar os corações. O ano começou e agora é outro tipo de pressão que se instala. As metas nos desafiam. Pressionam mesmo. Hábito arraigado de acreditar que a vida pode ser planejada. Na véspera do Ano Novo meu cunhado teve dois infartos. No noticiário há uma exposição de fatos que mostram as surpresas que muitas pessoas receberam, boas ou ruins, a desmontar os planos. O futuro nunca existiu. Nunca existirá.O futuro é uma armadilha criada para que a humanidade não pereça em letargia pura.

Acordar diariamente existe como realidade incontrolável. Alguns decidem cortar este circuito e se matam. Mas os que continuam vivos não controlam o fato de que se acorda todos os dias com um dia inteiro pela frente para ser habitado por gestos, práticas, falas, atitudes. Mas seguimos o dia sem qualquer poder sobre ele. E ao contrário, o que fazemos é listar tarefas e afazeres, marcar encontros e programar viagens, fazer projetos e manter relacionamentos estáveis.

O ano começou. E seja em qualquer calendário, o que existe é o incontrolável e invisível amanhã. Portanto poderíamos dizer que o calendário é feito apenas disso: de um único instante, ínfimo, da menor duração possível, sobre o qual também temos pouquíssimo ou nenhum controle.

Não sabemos quem somos, nunca saberemos. Estamos ajustados numa moldura de identidade e existem muitos de nós que têm uma fé quase inabalável em ser algo, em ser de um determinado modo. Os que batem no peito e dizem, com orgulho: “Eu sou assim”. E um vendedor mal humorado pode mostrar nosso pior lado. Um elogio pode apresentar nosso sorriso novo. Somos folhas, ao vento constante do instante. Somos feitos de um tipo de ar, de elemento volátil, iludidos pelo que se chama “existência”.

Não existimos para além do acaso. O acaso é aquele senhor que brinca conosco, ele sim, no controle. Por isso não existe futuro. Nunca existiu. Não existe Ano Novo. Existe algo que é, além de nós, e nos habita. Mas somos feitos de ar. Apenas isso. Havendo, no entanto, um corpo que nos cobre, temos peso e não voamos. E talvez por isso mesmo, não tenhamos o poder de ir até o país do futuro, onde só chega mesmo quem tem asas.

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