Por Eliana Mara Chiossi.
Fica bonito quando certos acontecimentos em nossa vida são cercados de simbolismos. Dessa forma, viram histórias pra contar. Os fatos que me levaram até a Arena num domingo começaram quando um amigo querido me levou para conhecer o Olímpico. Depois de alguns meses, há algumas semanas, expressei meu desejo de conhecer a Arena do Grêmio e também de assistir a um Grenal, e o editor me sugeriu que fosse tema da crônica. E, logo no domingo dia 9, realizei meu desejo e colhi impressões incríveis dos tricolores.
Senti que fechei um ciclo com minha ida à Arena cheia de torcedores, festiva, alegre, depois de ter visto o Olímpico quase vazio, visitado por poucos torcedores, com olhar nostálgico, em despedida de algo que não vai ter volta, muitos tirando fotos para registrar esta “casa”, que é do coração, cheia de alma, na qual mesmo uma paulistana como eu pode sentir uma aura de histórias e acontecimentos, como se o ar em volta estivesse repleto de gritos, de falas, de respiração, de expectativa. A Arena é monumental, uma construção futurista, impecável na sua arquitetura contemporânea, mas ainda não tem cheiro de história, cheiro de vida, cheiro de alegrias e tristezas, de choros e de sorrisos. Claro que o tempo vai trazer isso. Mas é o tempo. Me lembrei de uma música de Adoniran Barbosa, referência para nós paulistanos, cantada pela estrela gaúcha Elis Regina, Saudosa Maloca, que descreve, moradores que tiveram de sair de suas moradias para dar lugar a uma construção moderna. É outro contexto, mas o sentimento parece semelhante:
Se o senhor não tá lembrado/Dá licença de contar/Ali onde agora está
Este “edifício arto”/Era uma casa “véia”,/um palacete assombradado
Foi aqui seu moço/Que eu, Mato Grosso e o Joca
Construimos nossa “maloca”
Mas um dia/”nóis” nem pode se “alembrá”
Veio os “home” com as ferramenta
E o dono “mandô derrubá”/Peguemos toda as nossas coisas/E fomos pro meio da rua apreciá a demolição/que tristeza/que nois sentia/cada tauba ue caia/doía no coração/…
Saudosa maloca, maloca querida/donde nóis passemo” os dias feliz de nossa vida
Na véspera do Grenal, passei na loja oficial e achei uma parte de liquidação, comprei bem baratinho uma blusa florida que tinha na corola da flor o símbolo do Grêmio, mas já me dava uma credencial. Eu iria fotografar e queria estar mesmo gremista entre os gremistas.
Eu estava com medo. Ainda conheço pouco a cidade e menos ainda a Zona Norte. Tinha medo de me perder e não acertar o caminho para a Arena, de não saber em que local estacionar e vários outros medos, alguns bobos, mas eram medos. Cheguei fácil. Achei tranquilo o estacionamento, e o preço não era absurdo, mesmo porque eu ganhei o convite para a arquibancada. Já estava no lucro. Estacionei, fui uma das primeiras a chegar. Nada para fazer ainda. Decidi que iria fotografar a chegada dos que vinham pelo estacionamento. O calor não me deu ânimo para ir à rua. E por sorte encontrei uma família que me deu um lugar na sombra em que estavam sentados, com duas caixas de cervejas e refris. Me contaram casos, histórias e me acolheram. Era tanta expectativa que me atrapalhei na hora de entrar. Me disseram que eu teria problemas com a mochila, mas tinha a máquina, e eu tinha que levá-la. Nisso, eu não achava mais o convite. Pânico. A moça que me revistou, gente boa, me disse: “vou te ajudar a me ajudar, você vai tirando as coisas, vamos olhando devagar, e vai aparecer”. E deu certo. Estava guardado direitinho na carteira.
Na hora de entrar, fiquei parada, com a boca bem aberta uns segundos, deslumbrada. A Arena é admirável. É quase uma aeronave que estacionaram ali, na Zona Norte. E os gremistas foram chegando, e ficou praticamente lotada. Eu fiquei no meio da torcida que fica em pé atrás de uma das goleiras, gritando e motivando o time sem parar. Me lembrou a Torcida 12 do Boca, que eu vi num jogo na Bombonera. A 12 é incomparável. É uma loucura. Mas a torcida do Grêmio é muito forte. Bonito de ver.
Sai o primeiro gol, do Inter, e eu ouvi tanto palavrão… Alguns que eu não conhecia ainda.
Alívio quando sai o gol do Grêmio e xingamentos para os colorados. Chuva de papel. Um torcedor joga um chinelo para baixo. Os outros reclamam, falam que assim prejudica a torcida, que pode machucar alguém, mas o nível alcoólico não deixa a mensagem passar, e ele joga o outro depois.
Fazem uma homenagem bonita a Nico Nicolaiewski. Aplausos. Emocionante.
Missão cumprida. E eu não era mais a mesma.