Na primeira semana de julho, de terça até sexta (dos dias 2 a 5), foi realizada a última oficina de elaboração do Protocolo de Consulta Prévia, Livre, Informada e de Boa Fé da Comunidade Quilombola Vila Nova.
O Vila Nova é o Quilombo mais ao sul das 10 comunidades que vão de Osório até São José do Norte, que compõe aquilo que a historiadora Claudia Mollet define como o litoral negro. Apesar de mais de 200 anos no território, a comunidade vem sofrendo com uma série de ameaças ao seu modo de vida – como mega projetos de energia e mineração em fase de licenciamento, além das monoculturas de pinus que já invadem os campos de restinga e dunas.
Como enfrentamento às ameaças desses grandes empreendimentos – que inclusive tem avançado no licenciamento ambiental sem a devida consulta prevista na legislação – as famílias do Quilombo Vila Nova vem elaborando um Protocolo de Consulta Livre, Prévia, Informada e de Boa Fé com a mediação do Núcleo de Estudos Geografia e Ambiente da UFRGS e do Coletivo Catarse com o apoio do Fundo Casa Socioambiental. O protocolo vem sendo desenvolvido por meio de oficinas e está sendo elaborado tanto no formato escrito quanto no audiovisual, como forma de democratizar seu acesso, valorizar a oralidade e a sabedoria popular.
Além da realização da terceira oficina de elaboração do protocolo e gravação de 6 entrevistas para o documento audiovisual, as equipes de pesquisa e comunicação também acompanharam duas lideranças numa caminhada pelo território. Cruzando uma parte da comunidade que foi invadida pelos Pinus, foi possível chegar até uma faixa de restinga, com campos e áreas de mata, seguida de um banhado com o mar no horizonte. As lideranças comentaram que, antes da invasão do Pinus, do fundo de suas casas já se avistava as dunas e o mar. Essa mudança, além de dificultar o acesso à praia, reduzir a área de plantio e criação de animais, chegou até a impactar o regime de ventos do local.
Infelizmente, a silvicultura não é única ameaça à comunidade. Apesar da falta de consulta prévia, três mega empreendimentos já possuem a LP (Licença Prévia, primeira das três licenças ambientais). O “Complexo Eólico Ventos do Atlântico” pretende construir o maior parque eólico da América Latina – com 290 aerogeradores ocupando mais de 15 mil hectares, muitos dos quais fazem parte do território quilombola – e já pediu ao órgão ambiental a Licença de Instalação (LI). O complexo eólico Bojuru, que busca instalar 113 aerogeradores, estaria a 6,5 km da comunidade segundo os estudos apresentados pelo empreendimento.
Por fim o projeto de mineração Atlântico Sul – que engloba quase toda a faixa litorânea do município de São José do Norte, ameaçando além do quilombo outras comunidades de pescadores artesanais, agricultores e pecuaristas familiares – foi vendido pela RGM para a empresa Sheffield Resources de capital predominante australiano. Apesar da forte oposição à mineração por parte das comunidades do município, o projeto também já possui a Licença Prévia.
Justamente para garantir que sua voz seja ouvida sobre estes e outros empreendimentos que possam vir a afetar seu território, a comunidade está se organizando junto com apoiadores para a elaboração do documento, já em fase de finalização.
Texto: Bruno Pedrotti
Fotos: Billy Valdez
Pesquisa: Giulia SIchelero e Julia Ilha
Apoio: Fundo Casa Socioambiental