Carta ao Prefeito dos moradores da Cruzeiro

Bloco de Lutas, Comitê Popular da Copa de Porto Alegre e moradores da Grande Cruzeiro elaboraram uma Carta ao Prefeito e exigem respostas as questões contidas no documento até o dia 10 de julho de 2013:

Exmo. Sr. José Fortunati,

Prefeito Municipal de Porto Alegre,

O Comitê Popular da Copa de Porto Alegre atua desde 2010. Fazemos parte da ANCOP – Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa junto com outros comitês locais sediados nas doze cidades que receberão os jogos para a Copa do Mundo FIFA 2014. Viemos acompanhando o tema, estudando seus impactos e trabalhado diretamente com as comunidades que estão sendo atingidas. Durante esse tempo vimos diversas declarações e ações descabidas do poder público municipal quanto ao tratamento destinado a população que vive nas áreas que estão sendo modificadas pelas as obras relacionadas a Copa na cidade.

Nós do Comitê Popular da Copa de Porto Alegre, as comunidades atingidas pelas obras de duplicação da Avenida Tronco, o Bloco de Lutas pelo Transporte Público e apoiadores, viemos, através desta carta, chamar atenção para alguns fatos e apresentar nossas reivindicações.

Considerando sua declaração de que todas as obras de mobilidade seriam retiradas da matriz de responsabilidades da Copa do Mundo de 2014, mas que nada mudaria em relação aos prazos de encerramento por conta do aumento de custos e da pressão das empresas licitadas em finalizar os trabalhos, numa clara e deliberada tentativa de neutralização das lutas que até então utilizam como significante as violações de direitos humanos decorrentes destas obras;

Considerando sua declaração na assembleia do Orçamento Participativo de 02 de maio de 2012, na qual se comprometeu em não remover as famílias atingidas pelas obras até que as casas novas estivessem prontas, assumindo assim a campanha Chave-por-chave, desde que o governo Federal mantivesse os recursos disponíveis após o período da Copa, não comprometendo sua execução;

Considerando as últimas declarações públicas do coordenador técnico das obras da Copa, Rogério Baú, de que “só um milagre pode fazer com que as obras da Copa acabem no prazo previsto”, considerando que o principal empecilho seriam as negociações com os moradores residentes em áreas atingidas e que a primeira parcela do recurso previsto para a duplicação da Av. Tronco, a obra prioritária para a cidade, foi liberada apenas no dia 8 de maio de 2013;

Considerando que até hoje não foi apresentado um Plano de Reassentamento construído participativamente, mas apenas uma sistematização das necessidades de remoção com algumas soluções não condizentes com a necessidade real das familias ou soluções que violam direitos humanos como o Aluguel Social ou, ainda, o precário Bônus Moradia que já não cumpre a lei que o criou;

O Comitê Popular da Copa de Porto Alegre, as comunidades atingidas pelas obras e seus apoiadores entendem que as pautas do diálogo são as seguintes:

Chave por Chave

Parada imediata das obras da Av. Tronco até que sejam extintas as violações de direitos e construção de um plano de reassentamento participativo;

Revisão da lei que exime a Prefeitura de Porto Alegre reassentar no mínimo 80% das famílias de comunidades atingidas por obras de interesse público dentro da própria microregião ou num raio de 2km da moradia atingida;

Parada imediata da concessão de aluguel social para obras de mobilidade;

Aumento imediato do bônus Moradia e revisão de seu processo de concessão;

Repasse de informações corretas para a população, reuniões com as lideranças diretamente atingidas e atas das reuniões já realizadas;

Aquisição imediata de área para construção de unidades habitacionais da tipologia CASAS na região.

Negociação junto ao governo do Estado para desapropriação por interesse público e imediata gravação de AEIS III para construção de CASA na área conhecida como Cocheiras do Jockey Clube.

Prefeito Fortunatti sancionar imediatamente o projeto de lei que torna AEIS, Área de proteção de ambiente natural e cultural, aprovada na quarta-feira 03 de julho de 2013 pela câmara de vereadores por unanimidade, a área da FASE no Morro Santa Teresa.

Afirmamos que:

Sua manobra para neutralizar o significante principal do movimento, retirando as obras da matriz de responsabilidade da Copa, não deu e não dará certo. Pelo contrário, somamos forças com as movimentações sociais que explodem, neste momento, por todo o Brasil, por cidades justas e participativas, cuja produção, crescimento e investimentos devem ser decididos pelo poder popular.

Outras iniciativas débeis como a articulação da SECOPA com seletas lideranças comunitárias locais para neutralizar na base tais movimentações, também perdem legitimidade e mínguam rapidamente.

Entendemos que a retirada das obras da matriz de responsabilidades significa, necessariamente, que as obras devem parar até que os casos de violação de direitos humanos, especialmente os de moradia digna, sejam extintos, e por outros motivos, a saber:

Primeiro, a lei que garantia que 80% da população removida deveria ficar na região foi colocada de cabeça pra baixo por conta da Copa do Mundo, hoje é necessário que apenas 20% fiquem. Com a retirada destas obras da matriz de responsabilidade, ela precisa ser revista, pois a desvinculação implica em retomá-la como de origem.

Segundo, a coação individual, caso a caso, das famílias atingidas, brutalmente realizado pelo escritório do Projeto Nova Tronco deve cessar imediatamente. Lá são negociados o Aluguel social e o Bônus Moradia. O Aluguel Social significa insegurança de não ter mais a casa em que se morou durante décadas, ter o aluguel pago pela prefeitura e confiar nesta estrutura de coação para esperar casas cuja construção sequer iniciou. O valor do Bônus Moradia, referenciado no valor desatualizado do MCMV não será mais aceito enquanto não for atualizado e a terra considerada no momento da avaliação do imóvel a ser desocupado.

Terceiro, o que foi ofertado foram apartamentos na região ou casas fora da região. E quem no cadastro sócio-econômico optou pela tipologia CASA na região, como fica? Tem de escolher entre a casa ou a região: não há opção que contemple seu modo de vida, suas necessidades laborais, sua relação de vizinhança, sua rede de apoio familiar e de serviços públicos. Não há opção que respeite os moradores neste caso, senhor prefeito. No entanto, apenas metade das áreas das cocheiras do Jóquei Clube seria suficiente. Ela foi entregue a empresa Multiplan para um empreendimento de quase 1 bilhão de reais, exatamente no momento em que buscávamos diálogo com os vereadores para propor sua utilização.

Porém, pelo enclausuramento dirigista de seu governo que somente visa neutraliza e não dialogar com o poder popular que está nas ruas, encabeçado pela sua equipe da “governança solidária”, não se cogita um plano no qual os atingidos pelas obras possam deliberar sobre suas próprias vidas em conjunto com o poder público.

A prova de que um diálogo sem coação ou jogo de neutralização é viável são os terrenos desapropriados indicados pela comunidade da Av. Tronco, que se tornaram AEIS em 24 de junho passado e foram garantidas para os moradores da região por emendas construídas por eles e pelo Comitê Popular da Copa, juntamente com alguns vereadores. Nossas cidades já são “inteligentes”, senhor prefeito, basta olhar do modo certo e não procurar lá fora o que está pulando em sua frente.

Afirmamos com toda clareza: nossa vontade é que as obras de mobilidade sejam executadas, mas que os moradores da região também sejam beneficiados com as novas condições de urbanidade. A necessidade real dos moradores atingidos pelas obras é que eles apenas saiam de suas casas quando as casas novas estiverem prontas. A necessidade está nas ruas, se apresenta em cada reunião que realizamos em cada conversa na porta de casa que passamos, nos momentos em que os moradores não estão com medo e conseguem falar o que realmente pensam sobre a situação a que foram submetidos em nome do desenvolvimento da sua própria cidade. A necessidade é Chave por Chave!

Diante do exposto, Prefeito José Fortunati, aguardaremos até 10 de julho de 2013 respostas as questões contidas no documento.

Comitê Popular da Copa de Porto Alegre

Porto Alegre, 04 de julho de 2013.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *