Entrevista com representante do SAJU/UFRGS que vai à OEA

A Organização dos Estados Americanos (OEA) vai realizar uma audiência pública, no dia 28 de março, em Washington (EUA) na Comissão da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), para analisar a atuação do Estado Brasileiro nas manifestações, que vêm ocorrendo no país desde junho de 2013. Dentre as instituições, que redigiram o documento solicitando a audiência, está o SAJU (Serviço de Assessoria Jurídica Universitária ) da UFRGS e ele será representado pela Mariana Chies S. Santos, advogada do grupo 10, que atuou na defesa dos adolescentes apreendidos nas manifestações na cidade de Porto Alegre em 2013.

Ela nos concedeu entrevista por e-mail.

“Durante a sessão, serão apresentados relatos e dados que mostram violações cometidas pelos governos estaduais e federal. Caberá então ao Estado apresentar os seus argumentos e explicações.”

Todas as entidades que elaboraram o pedido de audiência para OEA terão representantes? E por parte do governo brasileiro, quais autoridades irão representá-lo?

A princípio as entidades que serão representadas serão a Conectas Direitos Humanos (SP), Justiça Global (RJ), Artigo 19, SAJU/RS e o Mandato da Vereadora Fernanda Melchionna que será representado por ela, uma vez que ela redigiu, como Presidente da Comissão de DHs, o relatório que foi entregue a diversas instituições do Estado do RS. Em relação ao governo brasileiro não sabemos ainda, já que o pedido de audiência foi respondido, formalmente, há menos de duas semanas. Não houve, até onde eu sei, pronunciamento formal por parte do governo.

“Serão apresentados mais de 200 casos de violações de direitos humanos ocorridas durante os protestos.”

Como serão feitas essas apresentações? E como será a dinâmica dessa audiência?

A audiência tem duração de 15 minutos e é aberta ao público. Apresentaremos os casos a partir do nosso relatório – o que foi enviado a eles – e mais alguns documentos, fotos e vídeos que estamos juntando. Foi uma junção de casos de violação que ocorreram em todo o Brasil a partir de junho de 2013. Em relação a cidade de Porto Alegre, foram relatados os casos dos adolescentes apreendidos, além de adultos que se dispuseram a participar de uma sessão na Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal logo após o ocorrido (uma semana, eu acho). Estamos organizando como será essa apresentação. Teremos que dividir o tempo em relação a todos os pontos que pretendemos tratar: desde a criminalização dos movimentos sociais, violência policial e leis de exceção que estão em tramitação no Senado (entre outros).

Qual o papel do SAJU/UFRGS nessa audiência e o que a entidade vai relatar (em linhas gerais)?

O SAJU/UFRGS atuou como entidade parceira no pedido da audiência e relatou os casos acompanhados em Porto Alegre. A ideia é relatar um pouco como foram feitas as prisões e apreensões e também da criminalização dos movimentos que vem ocorrendo aqui no Estado pós manifestações de junho de 2013, como a invasão à FAG, Moinho Negro, Utopia e Luta, apreensão de livros, etc. Somos uma das entidades que redigiram o pedido, então, como a audiência é pública a ideia é que um representante de cada instituição compareça, para representar e se fazer presente.

Qual a importância de uma audiência pública como essa?

A importância dessa audiência é que, pela primeira vez, o Brasil terá de responder as acusações que estão sendo feitas. Nesse sentido, parece que teremos que ter uma resposta para o que vem ocorrendo, já que desde junho do ano passado não temos. Então, por considerarmos inaceitável a criminalização de movimentos sociais enquanto país democrático, por considerarmos absurdo que tenhamos leis de exceção tramitando no Senado brasileiro e ilegal a maneira como a polícia de diversos estados vem tratando as pessoas que se manifestam na rua, pedimos essa audiência para mostrar que o Estado violou/viola direitos humanos. E dessa forma, caso a Comissão entenda necessário, ela poderá repreender publicamente o Brasil e isso pode ser utilizado para, por exemplo, os processos judiciais, como meio de prova.

“Posteriormente, a CIDH poderá lançar uma nota repreendendo publicamente o Brasil. O resultado da audiência poderá ser usado como evidência de violações cometidas pelo Estado nos atos de rua em ações judiciais em cortes nacionais e internacionais.”

Quais os possíveis desdobramentos em termos práticos dessa audiência?

Se a OEA acatar o nosso pedido, o Brasil será repreendido publicamente. O que isso significa em termos práticos? Olha, é importante para que o Estado deixe de ficar calado e inerte frente aos absurdos que vem ocorrendo. Não podemos mais aceitar que, depois de quase 26 anos da promulgação da Constituição da República de 1988, tenhamos uma polícia que trate os cidadãos do país como inimigo. Já existe uma PEC (nº 51) que está em discussão a respeito da desmilitarização da polícia (o que é um grande avanço), talvez ganhe mais notoriedade e o governo tenha que se posicionar. Talvez também tenha que se posicionar sobre como a polícia está agindo. E por aí vai. Poucos casos chegam à Comissão, então é uma vitória poder dar notoriedade ao que vem ocorrendo desde junho no Brasil (e desde de outubro no RS, com o episódio do tatu bola).

Mariana Chies S. Santos
Advogada do G10/SAJU/UFRGS

Mais informações: https://global.org.br/programas/governo-brasileiro-tera-que-explicar-a-oea-violencia-institucional-nas-manifestacoes/

Entrevista: Patrícia Knast De Camillis

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