Por Eliana Mara Chiossi. Trindade O caldeirão reluzia. Há tempos sem utilidade. O exílio forçado de tantas irmãs e amigas. Acima do fogão, uma sequência de vidros inclassificáveis. Era preciso sentir o aroma para traduzir seus poderes. Não sei explicar o início de tudo, daquele final de tarde anunciando a tragédia. Águas reservadas por sete dias, na recolha sistemática de orvalho e asas perdidas de libélulas. A ação planejada dos ventos e a influência exata dos movimentos da lua. O choro das mulheres violentadas furava nossos ouvidos. Nossos lábios estavam selados. O caldeirão continha água e fervura insistente. Lá fora, no quintal repleto de árvores nervosas, muitos homens aguardavam. Nada prendia seus corpos. E ainda assim, não se movimentavam. A substância do medo dava contorno ao ar. No centro do pátio, ainda em transe, ela dizia palavras antigas. Deu a ordem tão esperada. Os trabalhos foram iniciados. Sobre a cabeça de cada um deles, água fervendo e rezas seculares.