Cultura, Livre!

Marcando o reinício de suas atividades, o Ponto de Cultura e Saúde Ventre Livre está reconstruindo sua identidade visual. A ideia permanece a mesma, da figura representativa do ventre feminino como base do desenho, mas substitui-se o mapa do bairro Vila Jardim, que foi intrínseco durante praticamente todo o projeto, em virtude da mudança de sede e de característica de relações comunitárias que passam a se desenvolver neste momento novo conjuntural. Mesmo assim, não abandonam-se as raízes do projeto, seguindo-se aplicando este mapa em marca d’água em diversas peças a serem produzidas – mantendo-se, também, o contato com as redes estabelecidas previamente no local, que devem ser novamente estimuladas a participarem das atividades propostas. A nova imagem em destaque é do próprio logo criado para o programa de Pontos de Cultura da política Cultura Viva. Uma figura simbólica, que agora nasce deste ventre, pronta para lutar e produzir cultura, livre!

Mestra Sirley

Sirley Amaro é daquelas carnavalescas da gema. Se sentar com ela em sua casa, pra um café com bolo recém preparado, lá virão álbuns e mais álbuns de fotografias da grande foliona que é. Suas histórias preencherão todo o tempo da visita e ainda faltará o que dizer. Dona Sirley é Mestre Griô com muito gosto e faz jus à preservação da tradição oral de sua cultura. Em Pelotas, na Estação Primeira do Areal. GT: Dona Sirley, a senhora fazia bonecas, né? A gente podia começar com a senhora nos contando um pouco sobre o receio que aqui existia sobre se fazer bonecas negras… Se pintavam bonecas e se tinha esse receio de falar na questão do negro… Não sei se tu recordas isso, mas por que o receio de resgatar essa história? Dona Sirley: Não, não. Eu falei da falta de informação que a gente tinha quando surgiu a biblioteca Griô. Foi essa parte que eu falei, essa parte aí, né? GT: Sim, mas tu usaste a palavra receio… Dona Sirley: É, uma coisa que me ajudou a incentivar… Tudo que apareceu na cidade sobre o negro eu gostei de participar. Mas a gente não tinha muita informação, a gente não tinha também acontecimentos, palestras sobre a história do negro e, quando um casal veio para organizar essa biblioteca, fui procurada pela mulher porque eu fazia a roupa de bonecas para ela vender e eu comecei a tomar gosto e descobrir que boneca negra era uma coisa que não existia e achei muito interessante. Quando eles foram embora aqui de Pelotas, inclusive, ela levou duas bonecas de modelo que ela usava como manequim. E ela tinha até o modelinho das roupas, e, quando ela foi embora, eu disse pra ela, eu não queria entregar aquelas bonecas para poder ficar de lembrança, e ela até não tava querendo que eu ficasse com as bonecas, mas ela acabou deixando, e eu tenho uma naquele painel que eu carrego… É muito interessante, a minha mãe fazia bonecas negras. Na minha infância eu brinquei com bonecas negras. Só que tem essa coisa do receio… Até hoje a boneca negra trás um estigma. Como até ainda hoje as pessoas usam o boneco de pano para fazer oferendas, por exemplo, faz o boneco e dá o nome daquela pessoa que tu queres fazer o bem ou o mal, e isso faz com que pessoas até hoje tenham medo de bonecas, ainda mais de pano. Lembro de histórias de pessoas que não gostavam que os filhos ganhassem bonecas negras pois achavam que as pessoas faziam bonecas e já colocavam alguma coisa. Isso tudo eu já vi no decorrer da minha vida. Nos dias de hoje, por exemplo, quando eu iniciei a exercer a minha Ação Griô aqui no Instituto de Menores, eu tentei fazer uma oficina, em uma das viagens que eu ganhei do projeto, eu aprendi a fazer umas bonecas com uma professora em Porto Alegre, e as bonecas não tinham feições, aquelas negras da África que não tinham voz, que não deixavam elas falar, e eu trouxe uma boneca para mostrar a eles e tentei fazer uma oficina, mas eles começaram a achar que era vudu, feitiçaria e falavam muito naquilo. E eu, como estava começando as ações e precisava ter a simpatia deles, achei que não ia ser uma boa, eu podia insistir, mas achei que não ia ser uma boa. Aquilo poderia se espalhar na escola, e eu ainda não era bem conhecida, eu estava iniciando nas ações de cultura negra. Bom, mas, voltando à história das bonecas, eu nesse meio tempo resolvi iniciar a fazer bonecas, a tentar fazer bonecas de pano, pois teve toda uma trajetória. Eu me lembro que nesse meio tempo o Eduardo, que é meu filho e que mora comigo e hoje é evangélico, ele já estava envolvido com rap e começou a sair da cidade para eventos. O Eduardo nunca estudou, ele nunca teve uma profissão definida e agora no decorrer da vida é que eu vejo que ele é um artista. Ele teve o dom de trabalhar em várias profissões, nunca teve uma profissão definida, mas tudo que ele inventou fazer… Ele trabalhou de pedreiro, inventou coisas para fazer… Logo que aumentou a rede telefônica, que tinha aqueles fios coloridos, ele inventava florzinhas e vendia. Ele vendeu sanduíche na praia e aí, depois, ele começou a aprender a fazer brinco e se interessou em artesanato. E, em uma das viagens, ele começou a se interessar pela parte negra, viu muita coisa de bambus, de sementes, então ele, de repente, desenvolveu o dom de artesão. Sempre gostou muito de trabalhar com coisas naturais, bambu, semente e, de repente, ele foi em um evento por aí e viu que tinha um pessoal fazendo bonecas negras e me disse: “Mãe, vamos fazer bonecas negras”. E aí ele me deu as dicas, e aí eu comecei a pegar o gosto de fazer bonecas. GT: E vocês, quando começaram a fazer essas bonecas negras, vocês fizeram algum tipo de raciocínio? Por que não existia? Que seria indispensável… Vocês tinham esse tipo de pensamento, Dona Sirley? Dona Sirley: Sim, justamente. Eu sempre tive uma coisa em mim. Nos dias de hoje eu me sinto assim – não com vaidade – uma divulgadora e uma incentivadora da cultura negra. Eu sempre achava falta de coisas do negro. A gente não tinha televisão, era mais o cinema, e, devido a certas restrições e ao racismo que a gente sofreu em Pelotas até uma certa época, partindo daquelas bonecas negras e da viagem do Eduardo, que me veio com essa informação, aí foi toda uma caminhada. Eu não tenho datas, mas ele começou a se especializar nesses artesanatos mais tipo afro, e as pessoas gostavam, e aí aconteceu de eu ir visitar o outro, que mora na Bahia, e aí descobri que lá na Bahia eles vendiam as bonecas. Bonecas que são feitas para a região lá, tanto que eu tenho bonecas naquele …

Um adeus a Paulo Montiel.

É com muita tristeza que informamos que o nosso querido artista residente Paulo Montiel, faleceu no sábado passado (19 de novembro). Montiel, como era carinhosamente conhecido, foi um artista atento e muito ativo, mesmo quando um grave acidente o limitou fisica e mentalmente. Uma pessoa que não descansava, mesmo na calada da madrugada, que era onde surgia as suas maiores inspirações, seus novos projetos e quando arquitetava novos horizontes. Ultimamente, vivia em função da produção de seus calendários de orixás e projetando novos quadros à óleo de grandes dimensões. Expressava uma grande dor em relação ao preconceito e a falta de amor entre as pessoas, assim como uma grande vontade de transformar tudo isso em arte. Muito se foi com Montiel, porém tanto deixou também. [youtube https://www.youtube.com/watch?v=bcH4em5INos&w=971&h=546] Se depender de nós, será sempre lembrado.

Chalé da Cultura: edição

O documentário curta-metragem sobre o Chalé da Cultura se encontra em fase de edição. O Chalé, como é carinhosamente chamado, é um espaço de cultura e saúde que funciona dentro do Hospital Conceição em Porto Alegre. O filme vai apresentar as atividades do espaço e a sua importância dentro do ambiente hospitalar, já que acolhe internos, funcionários e residentes, na perspectiva da arte e da cultura. Acompanhe por aqui o andamento dessa produção, fruto das oficinas de produção audiovisual e musical do Ventre Livre.

Oba Kekerê – Rei Pequeno

Então o Sopapo renasceu, um gigante adormecido retumbou através do Projeto CaBoBu(1980), Giba Giba, grande mestre e autor do projeto, afirmava que ele deveria ter no mínimo 1.05 de altura para ser considerado Sopapo, cabendo a mim e meu pai(mestre Baptista) a engenharia de tal obra, assim foi feito e construido o Rei dos atabaques. Ele havia voltado, está vivo, porém alguns acham ele muito alto para ser usado em baterias de escola de samba, mas todos perceberam que em 2016, muitas baterias usaram atabaques em seus arranjos, e como ficará o Sopapo? esquecido novamente? não senhor… O Sopapo original, segundo o que consta na história…tinha 1,50m de altura x 60 de boca superior, o Sopapo do Projeto CaBoBu ficou com 52,5cm de boca superior x 1,05m de altura, nas escolas de samba antigas os Sopapos ainda eram maiores que as medidas usadas no Projeto CaBoBu, mas nem isso é suficiente para que ele seja reaproveitado nos sambas de enredo, o que está faltando? boa vontade? ritmistas? seja como for, a maior desculpa é quanto a altura do instrumento, que hoje está sendo muito bem divulgado e mantido por grupos musicais e culturais, mas o Sopapo não pode perder a grandeza de ser o originário de toda essa arte desenvolvida no tempos atuais, ele precisa ser mantido como Sopapo, mas precisa também se adaptar aos costumes modernos. Em respeito a memória do Mestre Giba Giba, o Sopapo continuará sendo 1,05m de altura, mas surge o seu filho…um Rei Pequeno… Ele tem a altura regular dum Timbal (92cm), 08 afinadores, construido com a mesma tecnologia da luthiearia do Sopapo…com uma inovação nos puxadores, esses agora são dobrados em L, dando mais firmeza e garantindo a durabilidade dos puxadores, mais leve, guarda as proporções do Sopapo, portanto não é um Timbal de madeira, é um Atabaque Rei em proporções menores, isso facilita o manuseio por pessoas de baixa estatura, acaba a desculpa de não ser usado em escolas por causa da altura e do peso, o som em grave médio mantém a postura do Sopapo Roncador, mas sua engenharia permite que ele também seja usado em naipes mais agudos… Ele vem preservando as origens africanas no nome e no formato, respeitando a tradição dos atabaques conceituados como de origem africana: Oba, pronunciado O-ba em yourubá, quer dizer “Rei”, Kékeré ou Kekerê em Yourubá quer dizer “pequeno”, no sincretismo do Candomblé iyakekerê quer dizer(mãe pequena), babakekerê(pai pequeno), essa analogia também cruza o Oba Kekerê com a ancestralidade sagrada, reforçando os laços do sagrado com o atabaque rei. Oba Kekerê – Rei Pequeno, veio para respeitar e reforçar a existência do Atabaque Rei(Sopapo), jamais para substituí-lo, pois é filho do Rei, tem no seu gene a natureza nobre do Pai, vindo para Aiê como uma Airá de seu Orixá batuqueiro, atraindo os raios que iluminam as sombras, em nome da justiça e da natureza guerreira para conquistar o seu reino. Kawó Kabiesilé!! José Batista