Por Eliana Mara Chiossi. Piedade Se eu amasse Hitler, eu seria uma santa. Teria, para meu pobre ditador, colo, perdão e sopa quente. Se eu amasse Hitler, arranjaria um jeito de ser surda. E falaria com ele apenas de assuntos banais como a textura do morango e a beleza dos cristais. Para evitar pesadelos e higienizar a memória dos relatos do horror que meu amado praticava, eu iria me transformar, pouco a pouco, numa estátua, pedra dura e condensada. No dia último de ser gente, morte tantas vezes desejada, teria na expressão do meu rosto, prévio monumento, a gravação terrível da certeza de que, ainda sendo Hitler, aquele homenzinho odioso era meu filho e era humano.